14 febbraio 2007

Relatos de um Mundo Normal

Eu lembro como se fosse hoje o dia que cheguei em Napoli para morar. Já tinha vindo outras vezes em viagens breves de 15 dias, no máximo. Mas foi quando eu vim em definitivo, que comecei a olhar tudo com olhos de moradora e não de turista.
Lembro do meu apartamento alugado no Vomero, uns dos melhores bairros de classe media da cidade. Me assustava pensando que todos aqui estivessem nervosos. Afinal de contas, em São Paulo, pessoas só batiam a porta do carro ou de casa quando estavam irritados. Muito. Me incomodava com o excesso de barulho: gritaria, buzinas e pessoas conversando de um prédio ao outro, pela janela. Também me assustei com a grosseria dos atendentes das lojas. Eles não estão la para te ajudar. Eles vendem e basta. Se irritam se você não compra. Nos supermercados percebi que era melhor nem comprar ovos porque as meninas dos caixas jogam as coisas em cima do balcão sem o menor cuidado. Percebi que todos tem pressa, muita pressa. Achava estranho ver os carros por todos os lados, estacionados em ate terceira fila, na frente dos protões dos prédios e ate no meio da rua, quando esta é larga. A falta de lugar para estacionar, os preços absurdos dos estacionamentos (raros) e a quantidade exagerada de carros é o culpado disso. Mas também me perguntava porque nesta cidade tão caótica não inventam uma solução como um rodizio, por exemplo.
Também foi traumático perceber que fila aqui não existe. Nem nos bancos, nem no supermercado, nem na barraquinha de frutas, hospitais, lojas, nada. Uma bagunça que impressiona e vence quem grita mais. Eu, tímida e paulista, alem de extracomunitaria sem saber falar com fluência a língua, ficava sempre por ultimo.
Percebi também que tudo o que eu tinha aprendido no Brasil não valia em nada aqui. Eu trabalhava com celebridades, fazia grandes eventos, organizava desfiles de marcas famosas, era responsavel de marketing de uma grande rede de pizzarias. Mas e ai? Os famosos do Brasil não são ninguém aqui, a rede de pizzaria não existe aqui e marketing? Che cazzzz è marketing?
Achava estranho que o Gianluca não fazia happy hour quando saia do trabalho. Happy cosa??? Dizia ele.
Eu pedia remedios pela internet, pizza pela internet, fazia pagamentos pela internet. A internet facilitava a minha vida. Aqui nao tem essa. Internet? Pra que serve? Nao é mais facil ligar pra pizzaria? Nao é mais seguro ir ate o banco? Que? Eu? Pegar uma fila (?) enorme para ir pagar uma conta se eu posso fazer com dois "cliks"? Mas nao!!! Pessoas estao começando agora a perceber a comodidade da internet, a ter uma linha adsl em casa e ate a mandar email.
Eu morava sozinha e sabia chamar o técnico quando algo quebrava, isso quando não consertava sozinha. Levava o carro no mecânico ou chamava o guincho quando acontecia algo. Mas nunca liguei pro meu pai pedindo socorro. Aqui não. Via o homem que conquistou meu coração, agindo como um menino. Tudo para o italiano menor de 40 anos é resolvido pelo papai, quando este ainda esta entre nos.
Claro que sem contar nas montanhas de lixo que estão pelas ruas, seja bairro bom ou ruim, seja na frente das casas como dos hospitais e escolas. E quando digo montanhas, não estou exagerando. são montanhas mesmo.
Ontem Gianluca voltou de Milano impressionado com o que viu. Diz ele:
- Milano é uma cidade estranha. Imagina! As pessoas no aeroporto fazem filas para pegar taxi! Nos bares, as 18hs fica lotado de gente que sai do trabalho e vai comer alguma coisa e tomar um aperitivo, como chama??? Happy Hour?! Não vi lixo pelas ruas, onde é que esse povo joga o lixo? Pessoas gentis. Mesmo com milhares de carros passando pelas ruas, não ouvi nenhuma buzina. Ninguém grita para chamar alguém. As pessoas trabalham mais calmas, se divertem. Não tem roupas penduradas pela janela. Estranha essa cidade. Sem confusão, embora seja grande.
Estranha??? Eu to indo para o fantástico mundo normal, finalmente!